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Highsexual, piadas e apagamento bissexual

11 janeiro 2015 Nenhum comentário

Por Moony

Ultimamente tem se falado muito, após uma série de publicações, sobre os famigerados highsexuals. Tudo começou quando algumas pessoas se juntaram num fórum relatando se considerarem heterossexuais mas experienciar desejos por indivíduos do mesmo gênero após o consumo de maconha ou álcool, alguém sugeriu o termo para definir e pronto. Vou separar as manchetes dos três primeiros resultados que aparecem ao pesquisar a palavra no Google e analisar como elas são colocadas:

“Depois dos g0ys, conheça o highsexual, hétero que vira homossexual após o consumo de drogas.”

“Highsexual: a definição de quem ‘fica gay’ depois de fumar maconha.”

“Highsexual: Pessoas estão ‘tornando-se’ homossexuais após fumar maconha!”

Percebam que há sempre uma dicotomia entre hétero e gay. Não existe meio-termo ou a consideração de que alguém pode vivenciar desejo afetivossexual por mais de um gênero: a pessoa era hétero e depois “vira gay”, “se torna gay”. A bissexualidade não é citada; sequer considerada enquanto possibilidade legítima.

Isso envolve muita complexidade, por mais incrível que pareça ao observarmos a série de piadas que estão sendo feitas. Vivemos numa sociedade heterossexista, normativa. Aprendemos através das várias formas de heterossexualidade compulsória, as violências rotineiras de quem foge ao que é considerado adequado sexual e afetivamente, que ser hétero é o natural, moralmente correto. Todo dia, toda hora.

Conseguimos após bastante esforço (e estamos bem longe do ideal) um pouco de visibilidade para gays e lésbicas. As pessoas já começam a ter exemplos, a se entenderem melhor como tal. Mesmo que seja um tema controverso, com muita gente falando coisas absurdas e cometendo N agressões, está sendo discutido. Está visibilizado. Algumas pessoas se importam, existem grupos de apoio.

Mas e pessoas bissexuais? Que exemplos a gente tem? Quem fala sobre nós? Quem fala para nós? Quando falam, o que falam?

Imaginem um cara que se considerou hétero a vida toda e começa a perceber desejos por outros homens. É uma crise aflorando, uma ruptura com tudo que a pessoa vivenciou até aquele momento. Ela sequer considera a possibilidade de que esse desejo pode coexistir com os outros. Bissexualidade não existe como algo real no imaginário popular.

“Agora sou gay? Deixei de ser hétero? O que eu faço?” Ou é um ou outro, é isso que a gente aprende. O contrário também acontece com gays e lésbicas: quando começam a sentir atrações divergentes do que se acreditava até então, a primeira reação é esconder ou, como é recorrente, dizer que é “coisa do momento” e enterrar no poço mais profundo, longe da vergonha e do auto-questionamento.

O álcool e a maconha são desinibidores, então é compreensível que ao usar essas substâncias o desejo tabu das pessoas fique mais à tona. Mais do que levar em tom humorístico e atirar pedras, precisamos refletir sobre o que leva a essas coisas, entender contexto, interpretar subjetividades e estender uma mão a quem precisa.

Exercitem a empatia e a compaixão.

A bifobia e o apagamento bissexual, assim como a homofobia, a lesbofobia e a transfobia, não são brincadeira. A gente precisa discutir essas coisas, e infelizmente isso só acontece em nichos das poucas pessoas que se importam de fato — os grupos do movimento bissexual, ainda em número ínfimo —, porque não temos espaço, não somos considerados relevantes o suficiente e, junto com a realidade que não se quer ver, somos jogados pra debaixo do tapete.

Não existimos.

Será?

Fonte: moonymoons

* Os artigos aqui publicados não representam necessariamente a opinião do Pará Diversidade.